Sonho de uma noite de verão - Amar para sempre por magia de algumas horas
- Júlio Moredo
- 10 de nov. de 2020
- 3 min de leitura
Uma das peças teatrais do icônico dramaturgo inglês se desenrola entre a cidade de Atenas, berço da razão filosófica e da Civilização Ocidental, e em um bosque em suas cercanias, muito provavelmente em um tempo inventado pelo autor

Nesta Grécia atemporal um casamento do duque e governante Teseu com sua amada prometida Hipólita, rainha das Amazonas, promete ser o acontecimento máximo daquele verão. Ao mesmo tempo em que, por intermédio de Egeu, um rico lorde, nos é introduzido um quadrado amoroso entre sua filha Hérmia, seu amado Lsiandro, Demétrio, prometido da garota, e Helena, que ama o último de maneira compulsória e doentia.
Egeu vem ao palácio do duque para reclamar dos importunos de Lisandro, que seduzira sua filha em detrimento do casamento arranjado com Demétrio. Os nobres acertam que até o dia seguinte a donzela Hérmia deverá decidir entre a união com quem seu pai ordena ou a morte pelas mãos dele.
A partir daí a peça, que poderia muito bem ser romanceada em prosa, se desenrola de maneira excitante e dinâmica aos olhos do leitor: Hérmia acerta com seu amado Lisandro a fuga para o bosque, onde eles se casariam em segredo. Helena, confidente de Hérmia, conta tudo a Demétrio por lealdade a seu amado.
À noite combinada o quarteto se encontra e desencontra dentre os arbustos do local, em passionalidade propriamente pujante da juventude, retratada num texto tão belo quanto divertido. Em detrimento de outras obras shakespearianas, Sonho de Uma Noite de Verão é das mais pacíficas e brandas em sua construção.
Brincando com os preceitos cármicos e de destino da literatura grega, além de misturar a história com mitos de outras matrizes, como duendes e fadas, a trama vai se intrincando em um jogo entre espíritos divinais e os mortais apaixonados entre si.
Oberon (rei dos duendes) e Titânia (rainha das fadas) estão em separação matrimonial pela cobiça afetiva de pródigo menino indiano adotado pela fada, em um claro símbolo da cobiça e inveja dos seres celestiais, tão presentes na cultura helênica. Estando ambos também no bosque, seu séquito presencia o embate entre os jovens e toma partido.
O rei duende, que descobriu o suco de uma flor flechada por Cupido, manda Bute (um travesso Arlequim), despejar nos olhos de Demétrio o líquido para que este não mais despreze a pobre e fiel Helena, ficando, pelo contrário, perdidamente apaixonado por ela. A confusão se torna geral quando Bute o confunde com Lisandro, fazendo com que ambos disputem, agora, o amor de Helena em detrimento a Hérmia.
Os núcleos se diversificam com a presença da trupe teatral que foi criada para encenar uma tragédia amorosa nas bodas de Teseu (uma homenagem de Shakespeare ao teatro, seu ofício, forjado em Atenas).
A companhia, composta por simples trabalhadores urbanos, acaba envolvida indiretamente na disputa. Ao ensaiar o drama no bosque, o galã do espetáculo, Fundilho, se vê perseguido por Titânia, cegada de paixão pelo suco. Ele adquire, por peripécia de Bute, uma gigante cabeça de asno para “deleitar” ainda mais a rainha.
A chantagem visa fazer Titânia ceder a tutela da criança a Oberon e, assim, encerrar a altercação entre o casal. Tudo, então, se conjura em uma temática una a partir do terceiro ato, ganhando contornos bonitos na expressividade em que o amor é louvado e demonstrado pelas personagens.
Ao final, a festa de matrimônio do duque se colore dos sonhos (dormidos e vividos) que todos os presentes na floresta estrelada em uma noite de verão pensam ter tido pela magia da água benta dos amantes.
Uma obra gerada no século XVI em honra a toda uma cultura de interação social construída pelo Ocidente e que, por isso, é tão atual em suas cenas. Um tratado escrito em forma de jogo dramático da inesgotável capacidade do ser humano em sentir e externar suas emoções.
Comments